28 de abril de 2015

Convidado especial

A sub-região do Douro Superior representa 44% da totalidade da área demarcada e, além da vinha, por lá continua uma importante e antiga cultura de olival. O clima mediterrânico adquire nesta sub-região características continentais, que a tornam a mais árida de todas, chegando a ser necessário recorrer a irrigação para obter o grau de maturação das uvas pretendido. Os terraços são mais homogéneos e o solo xistoso é menos rijo, podendo ser mais facilmente partido em pequenos pedaços. Produzem-se aqui vinhos da maior qualidade.


A Quinta de Lubazim fica na margem direita do Douro, em terras alto-durienses e transmontanas, e tem história e pergaminhos que remontam aos primórdios da nacionalidade, que a origem arcaica do seu próprio nome testemunha, pertencendo ao senhorio da família dos actuais proprietários desde meados do século XIII.

Não admira, por isso, que os rótulos dos vinhos aqui produzidos procurem ostentar a linhagem e ancestralidade da família que orgulhosa e louvavelmente mantém a tradição. No entanto, sem abdicar dos símbolos e valores próprios, a imagem gráfica poderia ser revista e actualizada de modo a adquirir maior legibilidade e impacto competitivo. Mas os rótulos, neste contexto, são apenas um detalhe.

Os vinhos da Quinta de Lubazim, empresa com sede em Vila Flor (ver video), acompanharam a acção promocional das Conservas Luças, em que o Verde Azeitona participou. Foi uma revelação, pois não conhecíamos nenhum dos vinhos, nem sequer por referência.

Tivemos oportunidade de provar o Lupucinus Branco Selection 2013, o Lupucinus Tinto Selection 2013, e o Quinta de Lubazim Grande Reserva 2009.


O Lupucinus branco (feito com Arinto, 40%; Viosinho, 30% e Gouveio, 30%; teor alcoólico12,5o) revelou-se um vinho de cor citrina e franca, frutado e bastante aromático, a que a acidez dá uma vivacidade e frescura surpreendentes e o torna persistente na boca – é um vinho que «enche» a boca –, tem bom volume e estrutura. Está um belo branco que, do ponto de vista gastronómico, se é bom companheiro do peixe em conserva, em condições de refrigeração adequada aguenta muitíssimo bem até uma carne assada de tempero forte.

O Lupucinus tinto (Touriga Nacional, 45%; Touriga Franca, 30%; Tinta Amarela, Sousão e mais 40 variedades, 25%; teor alcoólico14,5o) é um vinho não filtrado (apresentou depósito, pelo que convém decantá-lo), de cor retinta, com boa concentração. No nariz apresenta-se ainda um pouco fechado; na boca também não se revela imediatamente, mas apresenta notas florais e alguma ameixa preta. A estrutura não desacompanha o teor alcoólico, o que é bom sinal, sem, no entanto, deixar de ser um vinho muito macio, tudo qualidades indubitáveis que podem talvez ainda evoluir em garrafa.

Por fim, o Quinta de Lubazim Grande Reserva 2009. Segundo informação do sítio de internet (não da garrafa) – que nos perdoem os produtores, também precisa de cuidados –, é feito com Touriga Nacional (40%) e Touriga Franca (30%) a que se juntam outros 30% de Vinhas Velhas (?!). Exibe, sem vergonhas, um teor alcoólico de 14,5o. É um vinho retinto, com boa concentração e aroma franco. Sem termo de comparação com as colheitas anteriores, não nos é possível notar diferenças, mas é um vinho com boa estrutura, bem proporcionado na relação entre acidez e fruta (silvestre) e a intensidade das notas florais, que lhe dá complexidade. Não se dá muito pela madeira, mas pode isso querer dizer que está bem integrada. O tempo — «esse grande escultor», disse Marguerite Yourcenar — ter-lhe-á talvez acentuado a maciez, sem lhe fazer perder o carácter. Está na altura de o consumir, pois pode estar prestes a atingir o auge da evolução em garrafa, e está muito bom.  

Fica a curiosidade de provar os outros vinhos da casa, precisávamos era de saber onde se podem encontrar. Mas, torcendo um pouco o ditado, podemos acreditar que quem procura sempre alcança…

26 de abril de 2015

O mundo das conservas

A oportunidade, e ao mesmo tempo o desafio, de produzir alguns petiscos com base em latas de conserva de atum e sardinhas proporcionou um interessante e utilíssimo aprofundamento de conhecimentos sobre a indústria conserveira.
 
Antes de mais, é preciso sublinhar o facto notável de podermos ver todo um sector da indústria em renovação, neste caso muito apoiada na Associação Nacional dos Industriais de Conservas de Peixe e em iniciativas como a Loja das Conservas ou o restaurante Can The Can.
 
Renovação e revalorização da imagem das conservas como produto nacional da mais alta qualidade, que tem passado também por uma reavaliação e reactualização do grafismo tradicional, e ainda renovação na variedade e amplitude do seu uso gastronómico.
 
Guiados por Pedro Luças, representante das Conservas Luças, empresa de Matosinhos, cujos produtos excelentes trabalhámos nos petiscos, e cuja história remonta a 1887, aprendemos algumas características essenciais das conservas de confecção tradicional: a importância de alguns detalhes no tratamento inicial do peixe, do modo de cozedura e de tempero, mas também da colocação dos espécimes na lata, e como o peixe matura e envelhece na lata, adquirindo matizes e requintes de sabor, que os apreciadores e conhecedores, nacionais e estrangeiros, procuram como verdadeiras preciosidades.
 
O Verde Azeitona vai certamente continuar a dedicar muita e merecida atenção às conservas.

Conservas Luças


Fatia de pão fresco com azeite e flor de sal, 
beterraba e sardinha em molho de limão
Slice of fresh bread with olive oil, fleur de sel, 
slice of red beet and sardine in lemon sauce


Tosta barrada com molho, estilo dip 
(iogurte grego, queijo de barrar com ervas, cebolinho, pimenta) 
com sardinhas sem pele e sem espinhas
Toast spread with a rich sauce (dip style), 
topped with skinless and boneless sardines


Centro de alcachofra com rabanete, tira de 
ventresca de atum e pimenta preta moída 
Artichoke centers and radish topped
with tuna belly and ground black pepper

25 de abril de 2015

Conservas Luças



Pimentos de piquilho recheados com 
sardinhas em azeite de oliveira e piripíri, coentros frescos.

Piquillo peppers filled with 
sardine in piripiri and olive sauce, and fresh coriander.




Tosta com tomate seco, lombo de atum, 
pimenta preta moída e raspa de limão.

Toast with dried tomato, tuna loin, 
ground black pepper and lemon zest.




Wrap de abacate, sardinhas em azeite virgem extra Casa de São Miguel, 
flor de sal, pimenta da Jamaica, sumo e raspa de lima

Wrap of avocado, sardine in olive oil, fleur de sel, 
allspice, lime juice and zest

19 de abril de 2015

A minha vizinha de cima* – crónicas

A minha vizinha de cima não foi ver as Sombras de Grey. Esteve vai-não-vai, mas o temor de ser vista acabou por ser mais forte. O livro, folheou-o algumas vezes na Fnac, sempre numa pressa atabalhoada, saltando linhas, parágrafos, páginas — à procura de alguma coisa, embora sem saber bem o quê. 

Com os farrapos do que lhe chegou aos ouvidos, ostensiva e falsamente desatentos, algumas ideias começaram a arrumar-se-lhe na mente, sem remédio.

Pouco a pouco, formou um difuso, e confuso, imaginário equestre de espáduas retesadas e garupas luzidias, de arreios ornados de metais: selas, bridões, antolhos, rédeas, chibatas — flamantes línguas de couro negro.

Foi assim que, ao longo de muitos dias, se multiplicou, ufana, em trotes e pinotes, cabriolas e cavalgadas. Porém, o tempo às éguas também faz a sua mossa. E não se reconheciam naquele sobressalto dos nervos as qualidades que Frei António das Chagas atribuiu ao cavalo do Conde de Sabugal, que dava grandes curvetas. A bruteza sim, mas não a galhardia. E não se prestando a andadura à música, as salsas não lhe saíam airosas. Galopes de pau, dir-se-ia.

Sempre que aquele alvoroço cavalar a tomava, outras imagens a assaltavam, insistentes. No meio daqueles tormentosos prazeres, involuntariamente lhe apareciam — ele há coisas extraordinárias  as figuras de Rod Stewart e de José Sócrates, ofuscantes clarões.

Roderick fazia-lhe talvez lembrar as promessas e ousadias das primeiras fervuras do sangue, numa juventude tão distante quanto próxima. As promessas de José, essas, provocavam-lhe um anelante arfar, imperceptível e ao mesmo tempo indisfarçável, e uma espécie de taquicardia que, curiosamente, lhe pulsava no ventre.

E, nesses momentos, compungida sonhadora, a ideia do mortificado no seu retiro eborense enchia-lhe o espírito de sombras, que ela — mal ou bem — intimamente associava às de Grey.


Jorge Colaço
(convidado deste blog)

* Qualquer semelhança das personagens destas crónicas com pessoas existentes é pura coincidência. 

17 de abril de 2015

Convite


O Verde Azeitona vai estar na próxima quinta-feira, dia 23 de Abril, na Loja das Conservas da Rua do Arsenal, em Lisboa, entre as 19 e as 20 horas, convidado a apresentar uma preparação/degustação de petiscos no âmbito de uma campanha das Conservas Luças, a decorrer entre 20 e 26 de Abril naquela loja da Rua do Arsenal. Estão todos convidados.

15 de abril de 2015

Convidado especial


Para beber com a tábua de queijo Terrincho e bolos de figo, apresentamos três possibilidades, todas elas perfeitamente adequadas à proposta. A primeira é um Porto Vintage ou Late Bottled Vintage. A segunda é um monovarietal da Casa Ermelinda de Freitas: Petit Verdot 2010. A terceira, the last but not the least porque foi essa que elegemos para dar maior destaque, é o Pontual Reserva 2006. O seu tempo de vida está a esgotar-se – João Paulo Martins já nem o lista na edição de 2015 do seu Guia e já em 2012 avisava que estava no ponto certo do consumo. A verdade é que o vinho com 13%, feito com Alicante Bouschet (80%), Touriga Nacional e Syrah, ainda tem o seu interesse. No caso presente, que o cassis e a ameixa preta se apresentem efusivamente maduros até ajuda a potenciar a harmonia dos sabores, conferindo-lhe algum exotismo. O Pontual é produzido por PLC - Companhia dos Vinhos do Alandroal, que tem outros vinhos interessantes. De salientar, porque nem sempre é regra entre os produtores, a qualidade gráfica do rótulo.

Tábuas | Queijo Terrincho e bolos de figo


Queijo Terrincho velho
Bolos de figo
Toranja vermelha
Mel
Vinagre balsâmico
Gressinos

O queijo Terrincho combina muitíssimo bem, mas poderá ser substituído por outros queijos de pasta dura ou, por exemplo, por Roquefort ou queijo azul.
As variedades de bolos de figo utilizados foram: com nozes, com amêndoa e vinho do Porto e com alfarroba. Foram adquiridos numa banca dos Frutos Secos do Mercado e existem outras combinações disponíveis.

A calda para a toranja é simplesmente feita com mel misturado com algumas gotas de vinagre balsâmico. Quem gostar, pode polvilhá-las também com um pouco de pimenta preta moída.

8 de abril de 2015

Tábuas | Muxama de atum



Muxama de atum (adquirida no mercado de Tavira)

Maçã Granny Smith
Tomate cereja em rama
Azeitonas
Alcaparras
Salada de alface e rúcula
Pão
Tostas
muxama, ou moxama como registam os dicionários relevantes (em espanhol é mojama), embora a grafia mais generalizada, sobretudo no Algarve, seja muxama, pode – como frequentemente acontece com certos alimentos e pratos que um dia fizeram parte de uma dieta de  subsistência, em regiões pobres – ser apresentada hoje como uma especialidade de  extraordinário requinte, que não tem a difusão e o tratamento que merece. De textura sedosa e sabor vincado, se cortada o mais finamente possível e num contexto gastronómico adequado, de modo a realçar todas as suas qualidades, a muxama é um petisco magnífico. 

Para saber o que é a muxama, salientar o seu valor histórico e compreender o respectivo modo de preparação, socorremo-nos de um excerto do texto de Miguel Godinho*, do
 projecto Tasa, a quem agradecemos a devida autorização para ser aqui reproduzido.

«A mais antiga inscrição referente à pesca do atum na península encontra-se num conjunto de medalhas fenícias encontradas na zona de Cádis. Sabe-se que este povo a ele recorria como alimento de subsistência nas suas viagens marítimas. Certamente já conhecido nesta altura, a muxama é um destes antigos modos de processamento do peixe, que consiste na salga e posterior secagem das suas partes nobres. O termo provém do árabe musama, que significa “seco”, sendo que, conforme se deduz, já no período islâmico na península, este modo de preparação do atum seria muito utilizado, tendo sido legado ao período cristão subsequente.

Actualmente este processo é feito já de forma controlada, seguindo as directrizes que a lei exige, sendo que no passado era feito de forma tradicional, através da salga e posterior colocação do peixe ao sol durante o período quente, na linha do que ainda se faz tradicionalmente na zona do barlavento algarvio com peixes mais consumidos nessa zona, como a moreia.



O processo compreende a colocação de lombos de atum em grandes recipientes que são atestados com sal, durante um período de 24 horas. Após este primeiro estágio, são os mesmos posteriormente retirados e bem lavados, passando de seguida para uma câmara de secagem, num ambiente controlado, com uma humidade relativa de 60% e uma temperatura constante de 14ºC. A secagem deverá ser perfeita e homogénea já que servirá também para reduzir um pouco a percentagem de sal em resultado desse mesmo ambiente. Dependendo da grossura dos lombos, no final de 10 ou 12 dias, estará a muxama pronta a ser consumida, ganhando um aspecto semelhante ao presunto feito a partir do porco.

Próprio das classes mais baixas, este produto servia muitas vezes para acompanhar o pão, principalmente durante os períodos de maior escassez de alimento. Guardado durante todo o ano, era consumido nas jornas de trabalho, principalmente por pescadores.»
*Técnico Superior de Património Cultural | Centro de Investigação e Informação do Património de Cacela | Câmara Municipal de Vila Real de Santo António

7 de abril de 2015

Convidado especial


Encante
Tapada de Coelheiros
2009 tinto reserva
14,5%

É tão nova a marca, que o produtor ainda não teve tempo de o incluir no site da empresa. Mas ele aí está, à venda. É um vinho com um elegante equilíbrio entre a fruta e a madeira. Potente mas com a suavidade que só o tempo dá. Muito gastronómico. Acompanhou o cordeiro pascal, e encantou.

Cordeiro pascal


Metade de um cordeiro de leite, batatas e couves-de-bruxelas.
(As couves-de-bruxelas foram previamente cozidas e adicionadas ao resto a meio da assadura).

Temperar a carne pelo menos durante 24 horas com:

1 cabeça de alhos
azeite
banha
vinho branco
vinho do porto
alecrim em rama
1 laranja espremida


Aproveitar o facto de ser uma metade para fazer uma cebolada de costeletas de cordeiro:

temperadas juntamente com o resto da peça, fritar em azeite e alho e retirar da frigideira para fazer a cebolada com azeite e molho do tempero. Deixar refogar a cebola muito bem. Salpicar com um bom vinagre. Voltar a juntar as costeletas.


2 de abril de 2015

Tábuas | Salmão



Salmão cru com Parmigiano Reggiano, azeite e sumo de limão 
Chouriço de Porco Preto
Tomate cherry com orégãos
Boursin de pimenta
Molho tártaro

Convidado especial


Março, sinais de Primavera. O primeiro branco de final de tarde deste ano, depois das tarefas árduas. Chardonnay, 2012, Adega Mãe. Demos a palavra ao produtor.